segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Só crianças.


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Somos só crianças, meu senhor.
Disse então que era culpa de quem que o mundo não dizia mais nada pra mim?

Não era culpa de Deus, e nem sei se da falta Dele.
Quem me crucificava eram os homens de Deus, que me arrumavam uma história completa de vida, só de me ver aos chãos.
E os que não eram homens Dele, nem me viam nas ruas.
Me ignoram e ignoram, dizem que existem tantos prós maiores.

Não eram os animais que me mordiam e picavam e eram cruéis comigo.
Eu também fui cruel com eles, sabe, é uma guerra da carne.
Talvez eles façam falta.
Talvez os bravos que levaram todos eles de mim, saibam menos ou nada sabem de mim, e deles.

Somos só crianças, meu senhor, por favor, apague essa luz?

Essas luzes todas nos matavam bastante, e a culpa não é do brilho.
É do escuro que faz nos cantos que a gente fica.
É da falta de luz em excesso, tão em excesso quanto a quantidade de luzes para eles que quem ver.
A falta de luz em nós fez com quem o brilho da luz pros outros soasse como medalhas e então tentaram tirar-nos do escuro.
E nos viram. E então pensaram em nos matar.

E nem é você, claro que não né?
Nunca é você.
É sempre o próximo. O outro.
Já te vi, e te vi tanto e tanto.
E nunca soube fazer nada.
E a culpa é dele, do outro, do próximo, do vizinho, daquele, enfim.
A culpa nessas frases é "nunca minha".
Eu sei, eu te conheço.

Diz pra mim, senhor, por quê estamos aqui?
Somos só crianças e não sei pra onde ir.
Juro que se eu soubesse, tinha ido desde quando nasci.

Você nunca sabe, não me destrata, é hipócrita:
Finge que eu não existo.
E é por você não me ver, todo dia eu corro.
Todo o dia eu morro, embaixo da ponte, ou em cima do morro.
Na mão da polícia ou na mão do ladrão.
Com a sua ignorância e pela sua indecisão.

Eu sou um resto, eu sei disso.
Eu sou o resto da sua comida, o resto do seu troco, o resto da sua água.
Eu sou o resto do todo.
O resto da desigualdade, da economia prosperante, do que se diz protestante.
O resto de tantas mudanças, de tantas evoluções, das mudanças sociais, da atitude dos radicais.
O resto da miscigenação, da influência estrangeira e do jeitinho zé carioca.
Eu estou à margem. Nós estamos.
As ruas por onde ninguém passa, as roupas que ninguém usa, os cantos que ninguém olha.
Eu sou o que sobrou desse mundo.

Agora me ajuda, senhor: acima de tudo, somos crianças.
Somos só crianças.
Só crianças.


Enfim, faz tempo que não posto, mas esses dias eu estava planejando sobre a gravação de uma EP aí, e escrevi isso, era um desabafo. Tenho muita raiva das pessoas hipócritas que me cercam.
Isso é um esboço de um fim do mundo..